Português, exame ADOC (Faculdade de Letras no Porto )
Formação Profissional
Curso de Primeiros socorros Secretaria de Estado da Segurança Social e Prevenção no Trabalho
Curso de Jovem Empresário Agrícola Ministério da Agricultura
Curso de Aquisição de Competências Sócio Profissionais (POEFDS ) Sendo constituído por duas partes: Uma de Formação teórica com duração de 492horas, estando incluídas 120horas de informática, ministradas pelo Exmº Doutor António Mansilha; e a outra, de Formação Prática com duração de 168horas, correspondendo a um estágio, na entidade Junta de Freguesia Stª. Eugénia, que se está a prolongar desde Janeiro até à data. Exercendo as Funções de Toda a Parte Administrativa, Atendimento ao Público, ensaios, debates, levantamentos Sócio Culturais, Patrimoniais, Históricos, Estudos, Planos e Objectivos, requerimentos para todas e quaisquer Repartições(como por ex.: Pedidos de Licença de plantio, reconstituições, certidões de teor, apoio telefónico, contagem de tempo para ex-combatentes, subsídios agrícolas, declaração de transporte de produtos agrícolas, de residência, de posse, de condição económica, de vida, etc. etc.), buscas na Internet. Uma espécie de «Loja do cidadão», mas, com um só «funcionário polivalente», um verdadeiro gabinete de apoio ao munícipe.
Formação Específica
Leitor Cobrador
Técnico Classificador de Vinhas
Animação Cultural
Promoção Cultural
Levantamento de Prédios Rústicos
Recenseamento Geral Agrícola
Censos
Previdência Social, direitos, deveres, legislação e novos documentos
Imobiliária
Vindima, transporte, legislação e fiscalização
Formação Autarca Autarcas, Autarquias, Municípios e Munícipes
Formação Autarca Protecção Civil
Colóquios, Retiros e Fóruns
2 de 1 semana cada 1 Seminário de Vila-Real(Padre Feitor Pinto ), incluía temas como: Historial do Cristianismo e das Religiões mais significativas; Cristianismo, outras religiões e liberdade de culto; Igreja e Estado; O cristão e a sociedade contemporânea; Paz, guerra, direitos universais do homem, Objectores de consciência , solidariedade e mecenato; Idealismo e Materialismo; Cristianismo e Marxismo.
Experiência Profissional
2002
Estágio na Junta de Freguesia de Santa Eugénia
2001
Censos
2000
Leitor de contadores eléctricos EDP(concelho de Alijó, Sabrosa e Murça )
1999
Escriturário Norte Frangos
1998
Vendedor Norte Frangos
1997
Vendedor Monteiro & Filhos
1996
Técnico Classificador de Vinhas (ENDEM, Instituto do vinho e da vinha )
1995
Promotor Cultural Grupo Desportivo Cultural e Recreativo de StªEugénia
1994
Técnico de Armazém (Exportação ) Moto Meter
1993
Imobiliária -( Madrid )
1992
Mordomo -( Madrid )
1991
Barman ( Madrid ); Censos
DE 1977 a 1992
Fui Empresário Agrícola, embora, por vezes, acumulasse com outras funções
1987
Recenseamento Geral Agrícola
DE 1984 a 1986
Mediador de Seguros Eagle Star
De 1979 a 1981
Educador de Adultos Ministério da Educação
1973
Levantamento de Propriedades Agrícolas Ministério das Finanças
DE 1972 a 1973
Escriturário Colégio Nossa Senhora da Boavista ( Vila Real )
De 1970 a 1972
Escriturário Casa do Povo de Santa Eugénia
Teatro Autor, Co encenador e Actor
Co Fundador do Centro Cultural e Recreativo de StªEugénia
Co Fundador do Grupo Desportivo Cultural e Recreativo de StªEugénia
Co Fundador do Centro Social de StªEugénia
Direcção da Casa do Povo de StªEugénia
Assembleia
Candidato a Assembleia de Freguesia
Candidato a Assembleia Municipal
Deputado da Assembleia Municipal
de Freguesia
Militante de Partido Político
Sócio dos Bombeiros Voluntários de Alijó
G.D.C.R.StªEugénia
Cento Social
Cooperador do Funcionário/Encarregado do Grémio dos Viniticultores
dos CTT
Estafeta dos CTT ( Carteiro )
Explicador
Participação em Torneios de Damas e Xadrez
Participação na 1ªVinord ( 3º Lugar Canções )
Participação no 1º FITEI ( Festival de Teatro de Expressão Ibérica )
Atleta de Futebol
Membro de Mesas da Assembleia de voto; Inclusive 16/12/2001 e 17/03/2002
Organização de várias excursões:
Santarém
Braga
Castelo Branco
Mirandela
Santiago de Compostela
Membro do Grupo Cristão «Oásis»
Delegado Político
Encontros de Municípios
Participei em várias iniciativas do INATEL
Co Fundador da Associação de ovinos e caprinos de Vila Real e Bragança
1968 Fundei e Redigi um jornal de turma (Gomes Teixeira)
1970 Co Fundador do Jornal menor, «O Plátano»
1974 - Participei Activamente nas campanhas de «Politização»
Cargo ou profissão
Administrativo
Principais responsabilidades
Toda a Parte Administrativa; Atendimento ao Público; Ensaios; Estudos; Levantamentos, etc.
Assim como falham as palavras quando querem exprimir qualquer pensamento, assim falham os pensamentos quando querem exprimir qualquer realidade. (A.C.)
António Gedeão e Eugénio de Andrade: Viagens pela Urbe Babilónica
«Conheci as cidades de muitos povos
E aprendi os seus costumes»
Homero
«Dessas cidades, só ficará o vento
que por elas passou»
Bertolt Brecht
Agora que o segundo milénio fenece, assistimos a dois fenómenos sociológicos tão paradoxais quanto interligados. A um lado, as crescentes solicitações de um planeta urbano e dinâmico, susceptível de exaurir as energias do indivíduo e de sectar a sua harmonia. Noutra riba, assiste-se ao ensimesmamento, à alienação, à hipertrofia da pessoa. O choque científico e cultural que Alvin Toffler designou de «Terceira Vaga», a extinção célere de valores, as desconfortáveis lacunas afectivas expõem o ser humano à erosão do tempo-destruidor. Quando incapaz de se adaptar, o bípede remete-se à loucura o «Sapiens Demens» da pós-modernidade. Alternativamente,refugia-se no antigo, o santuário onde a tradição, a ideia de autenticidade e sabedoria se mesclam. De facto, o conhecido e o imutável procriam segurança. Significativamente, Milan Kundhera intitulou uma das suas lombadas de O Livro do Riso e do Esquecimento, alusão, por sinédoque, à insanidade e ao passado: os textos redutos da idade hodierna.
A ideia de metrópole foi o cabo extremo e último do romantismo a penetrar na estética modernista. Reciclou-se com Hart Crane ou Rimbaud, volvendo-se na «mise-en-scène» do homem novo, espaço apropriado para sugerir a devastação e a angústia, fervilhante de descompassada ruína ou criatividade enérgica.
Nas páginas da poética portuguesa, arriba sem grande pontualidade exprime-se em berço no realismo / naturalismo de Cesário Verde; atinge a adolescência com a eclosão do Modernismo, nas facetas Álvaro de Campos e Sá-Carneiro.
A partir dos anos ´60, a urbe re-emerge, com laivos existencialistas. É o espaço dessacralizado, zona de desencontros marcados, o cenário para as lucubrações de Gastão Cruz, Eugénio de Andrade ou Sophia Andresen. Esta autora, em diversos dos seus intrometidos, reza o negativismo dos grandes centros populacionais.
Um poema exemplar: em linhas como:
«Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas,
Ó vida suja, hostil, inutilmente gasta,
Saber que existe o mar e existem praias nuas,
Montanhas sem nome e planícies mais vastas
Que o mais vasto desejo,
E eu estou em ti fechada e apenas vejo
Os muros e as paredes e não vejo
Nem o crescer do mar nem o mudar das luas.
Saber que tomas em ti a minha vida
E que arrastas pela sombra das paredes
A minha alma que fora prometida
Às ondas brancas e às florestas verdes»
(Sophia Andresen, «Cidade», Livro Sexto)
Porém, mais do que qualquer um dos escritores convocados, o fascínio da repulsa prolonga-se a um estado climático, na década de setenta, com Jorge de Sena. Apátrida de duas pátrias, a sua vivência nos Estados Unidos, numa América que é uma vastidão pontilhada de cidades, trouxe-lhe a inevitável náusea sartriana.
No poema «Paraísos Artificiais», poeta assim:
«Na minha terra, não há terra, há ruas;
mesmo as colinas são de prédios altos
com renda muito mais alta.
Na minha terra, não há árvores nem flores.
As flores, de tão escassas, dos jardins mudam ao mês
e a Câmara tem máquinas especialíssimas
|para desenraizar as árvores
O cântico das aves não há cânticos,
mas só canários de 3º andar e papagaios de 5ª.
E a música do vento é frio nos pardieiros.
Na minha terra, porém, não há pardieiros
que são todos na Pérsia ou na China,
ou em países inefáveis.
A minha terra não é inefável.
A vida na minha terra é que é inefável.
Inefável é o que não pode ser dito.»
(Jorge de Sena, «Os Paraísos Artificiais», Poesia I).
As grandes urbes americanas são os cenários ideais para o ultra-romantismo da banda-desenhada. Lembremos, a exemplo, os quadradinhos de Batman, o Homem-Morcego, na sempiterna e nocturna Gotham City; no Super-Homem, na perversa Metrópolis; ou no Homem-Aranha que combate o crime, lançando teias entre o cimento e o asfalto.
O homem moderno está cansado da cidade. Os tumultos de Los Angeles foram, entre outros, um exemplo da difícil convivência inter-comunitária e o falhanço da multicultura estadunidense. Por outro lado, e por todo o planeta, as grandes urbes estão a revelar-se locais de degradação.
Na cinematografia, Wim Wenders apresenta-nos as películas Um Anjo na Cidade e Alice nas Cidades, reflexos daquilo que Henry James apelidou de «a civilização dos hotéis». Com efeito, homem moderno é um nómada e um estranho no seu território, singrando a incomunicabilidade.
Numa análise vinda a lume em 1992, os sociólogos Charles Reeves e Sylvie Deneuve descrevem nestas linhas o actual estado das mega-metrópoles:
«No subúrbio rico onde estamos alojados, tudo funciona na perfeição: as estradas estão em óptimo estado, o lixo é recolhido todos os dias, o correio é distribuído, as crianças vão à escola, a polícia parece civilizada... Há quem cuide das árvores e apare a relva. Numa área de dez metros quadrados, trabalhadores hispânicos, equipados com máquinas altamente eficientes (Made in Japan), cortam a relva quase milimetricamente e aspiram as folhas mortas. Mas não viemos aqui (Chicago) para fazer de conta que estamos ricos. (...) Depara-se-nos outra América logo desde a estação de origem. Tudo está velho, partido, ferrugento. Nada é reconstruído de raíz, tudo é grosseiramente consertado, quer sejam os edifícios, as instalações ou os comboios. Os horários não são funcionais e, por mais de uma vez, ficámos bloqueados entre duas estações... Os transportes públicos são um bom exemplo do triste estado em que se encontram as infra-estruturas urbanas. (...) As ruas e os passeios estão cheios de buracos, os edifícios, em mau estado de conservação ou mesmo em ruínas, e as ruas têm um aspecto bastante pobre».
(Charles Reeves, Sylvie Deneuve, Viajantesà Beira de uma América em Crise).
Os gregos, inventores por excelência da «pólis», acreditavam na cidade como um lugar material onde o espírito poderia florescer. Seria o metafórico casamento entre Fausto e Helena, respectivamente a matéria e o espírito. No entanto, este fracassou, e o divórcio está à vista. Talvez até já o pressentíssemos. Recordamo-nos do mito da Torre de Babel. O livro do Génesis relata-nos, nesta metáfora avanletrista, o destino dos habitantes dos grandes centros populacionais:
«Os homens, que falavam então uma só língua, ao emigrarem no Oriente, vieram até à planície de Senaar, onde pretenderam construir uma cidade com a sua torre, servindo-se de tijolos cozidos e de betume, que faziam respectivamente as vezes de pedras e argamassas. Queriam perpetuar o próprio nome e evitar a dispersão. Mas Javé desceu até lá e, para lhes furtar a empresa, confundiu-lhes as línguas e dispersou-os pela face da Terra.»
(Génesis, 11, 1-9).
O «animal scriptionis», o escritor, revela a falha que aparta material e ideal, e toma natural afeição e partido pelas coisas do espírito, ainda que com coturnos no mundano. Temos presente um texto particularmente significativo do contista Italo Calvino. Marcovaldo, um trabalhador desenraízado da ruralidade, habita agora na cidade. Saudoso, procura na metrópole sinais que lhe permitam reconhecer no horizonte urbano um resquício de aldeia. Nota um cogumelo, mas o cogumelo é venenoso; repara num coelho, e porém, o coelho é cobaia de uma experiência médica; vislumbra uma árvore, e eis que esta é apenas um placard publicitário...
Na dissecação dos efeitos da urbe sobre o homem hodierno, dois poemas me parecem relevantes, nas letras nacionais: o texto «As Palavras Interditas», de Eugénio de Andrade, inserido no «opus» homónimo de 1951; o poema «Cidade», de António Gedeão, parte da colectânea Teatro do Mundo, datada de 1958.
Submetendo-nos à ordem cronológica de publicação, comecemos pela produção de Andrade. Neste autor, as grandes cidades exibem tantas facetas quantas imperceptíveis arestas. Nalgumas das suas páginas encontramos a dedicação quasi-incondicional à capital do norte, onde vive, e que já lhe mereceu a antologia Porto, Os Sulcos do Olhar. Também presente está Lisboa, no poema de igual título. Noutros escritos, o sujeito poético deambula por urbes estranhas desde Veneza, até, mais recentemente, Manhattan, o coração de Nova Iorque. Porém, no texto germinador deste breve ensaio, a cidade emerge como um espaço não amado, anónimo e incaracterístico, simbólico e representativo intemporal, portanto. «Ecce poema»:
AS PALAVRAS INTERDITAS
«Os navios existem, e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.
Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas voltadas para o mar.
Anoitece, não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.
Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.
As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.»
(Eugénio de Andrade, «As Palavras Interditas», As Palavras Interditas, 1951)
O título do poema é significativo, e não isento de alguma ledice fónica: «Palavras Interditas», «Palavras Inter-Ditas» (proferidas entre duas pessoas). Porquê «interditas»? Diversas reflexões hipotéticas se colocarão ao leitor: a) por serem censuradas, proibidas por alguma instituição? b) porque o eu / emissor não as consegue exprimir, transmitir?; c) O tu / receptor / pessoa amada não recebe a mensagem, ou não a aceita, ou não responde?; d) a mensagem é factualmente emitida, porém, o receptor interpreta-a de forma distorcida?
A impossibilidade de comunicação é, em qualquer caso, o tema do texto. O cenário citadino, infere-se, será o de uma Babilónia de tão diferentes discursos e díspares sensibilidades que a troca entre os habitantes não sucede. Tal assunto será retomado, dois livros depois, na obra Coração do Dia, na primeira estrofe do poema «Um Rio Te Espera».
Uma leitura próxima de «As Palavras Interditas» exclui umas e concretiza outras das pistas enunciadas. Elabora-se, no texto, um esquema comunicativo. Existe um emissor («as palavras que te envio»), uma mensagem, que poderá ser a da terceira estrofe («Amo-te»), um receptor ou ente amado («meu amor»).
A interdição das palavras é resultante, como nota o emissor, da negação da comunicabilidade: «se alguma |palavra| regressasse, nem já reconhecia / o teu nome nas suas curvas claras». A trincheira é, portanto, da responsabilidade do «tu», do outro. Porquê? Três hipóteses: a) o receptor recusa a prova de afecto. Neste caso, o conflito entre o poeta e a pessoa amada poderá ser indício, microcosmos, da situação de guerra que é evocada no poema; b) o receptor não chega a receber a mensagem, talvez por estar ausente na guerra, ou dela ter sido vítima; c) a guerra transtornou tanto o receptor que, sendo já uma pessoa diferente é indiferente, passo o trocadilho, à mensagem do eu poético.
O discurso do conflito é reflectido em vários momentos do poema. Enfatiza-se a anti-naturalidade da guerra: a «cinza» dos bombardeamentos humanos opõe-se à «areia branca» natural. Também na segunda quadra se diz: «uma criança passa de costas voltadas para o mar» uma imagem a mostrar que a guerra é um facto político-social, postura de contradição com a fusão homem / natureza. Aliás, os elementos naturais pré-socráticos estão representados no texto: água («rios», «mar», «água»), ar («vento», «ar»), terra («areia», «colinas», «pedra escura», «margens»). Só o fogo é humano, resultado da máquina bélica («luzes das colinas» labaredas das cidades flageladas). Mais explícitas são as referências aos soldados deslocadas para a batalha («é preciso partir») ou à angústia dos que permanecem ou caem mortos em terra estranha («é preciso ficar»), dos que regressam feridos («hospitais»), dos bombardeamentos («cobrem-se de cinza»), a devastação («dias quebrados» ou «margens nuas»).
Ainda neste âmbito, é relevante reparar no cenário do poema. Tons escuros cobrem o texto: «cinza», «pedra escura», «noite». O dia cai, ao longo dos versos: «anoitece», «ondas de sombra», «primeiras luzes das colinas», «mãos nocturnas», «a noite escura». Tudo a culminar na ágorafobia final, versos belíssimos.
Porém, repare-se na ambivalência poética eugeniana. A liberdade de opção do ser humano a recordar a Manuel Alegre «Com estas mãos se faz a paz e se faz a guerra» a árdua escolha ou não escolha dos existencialistas. A guerra morta («Thanatos») ou a paixão («Eros») estão presentes em «As Palavras Interditas». Com efeito, a «pedra escura» tanto pode ser uma lápide tumular, como o genesíaco menir, símbolo megalítico de fertilidade. Ainda nesta linha, o «halo das searas» tanto representará o clarão das explosões do bombardeamento, como se poderá relaccionar com crenças pagãs que ligam o trigo à fecundidade. O trigo ou o cabelo loiro eram tidos como resultantes da intervenção de de uma cabeça sagrada do deus Sol (Apolo, Adonis, Orfeu, Tammuz), da deusa lua (Ceres) ou da deusa terra (Cardea, Mai, Maya, Mari ou Maria). Por fim, acresce dizer que a própria noite tem, na tradição poética, ínfimo campo de relaccionamento: morte, amor: «a noite cresce, apaixonadamente». E é nas suas margens que nos encontramos. Numa riba, o emissor, o eu; noutra, o receptor, o outro, o inferno sartriano. Num lado, o bem; noutro, o mal. Entre ambos, o abismo da escolha, a separação, as pontes queimadas, a indecisão do poeta estadunidense Auden, ao terminar o seu poema «ou nos amamos ou morremos» ou será «amamo-nos e morremos» ?
Também encarará assim a cidade, o poeta Gedeão? Numa entrevista a Mega Ferreira (JL, ano II, nº 28, p. 6), Rómulo de Carvalho confessa «O homem é mau, por natureza». Uma atitude anti-rousseauniana, rente às crenças do escritor nobilado William Golding.
E no entanto, a humanidade espreita à esquina dos seus versos. A propósito dos escritos de Gedeão, o compositor José Niza dilucida: «Havia um homem, havia uma história, havia um palco» (JL, ano II, nº 28, p. 7). O ser é, para este poeta, um «animal aflito». Mas, que torniquete o oprime ? Quem lhe insufla o sopro do dia seguinte ?
Ao escritor custou meio século a vencer a timidez e a oferecer à luz os seus poemas. Caso raro, para quem, aos dez anos, já poetav. Porém, comum a todo aquele que se furta ao «gliteratti». Lembremos Torga ou Régio, a exemplo. Uma estreia tardia alvitrar-se-á mas seguramente ganhante em maturidade e consistência. Os dados de um escritor jogam-se no terreiro da época histórico-literária e na vivência ontogénica. Gedeão atravessou o existencialismo «da capo al fine». Desvendar o seu conceito do que é o bípede inteligente é desentranhá-lo do húmus dos seus poemas e enxertá-lo na época em que foram produzidos. Esperar-se-ia, assim, que Gedeão nos recortasse do papel personagens atormentadas pelo existencialismo, crentes em que «o ser é uma liberdade sem sentido», e dizendo «o homem é o lobo do homem», ou, na versão do poeta germânico Reiner Kunze «um é o cotovelo do outro». Uma urbe animalesca, enfim. E porém, no poema para que vos convoco, intitulado «Esta é a cidade», a perspectiva é, até certo grau, positiva.
Ouçamo-lo:
«Esta é a Cidade, e é bela.
Pela ocular da janela
foco o sémen da rua.
Um formigueiro se agita,
se esgueira, freme, crepita,
ziguezagueia e flutua.
Freme como a sede bebe
numa avidez de garganta,
como um cavalo se espanta
ou como um ventre concebe.
Treme e freme, freme e treme,
friorento vôo de libélula
sobre o charco imundo e estreme.
Barco de incógnito leme
cada homem, cada célula.
É como um tecido orgânico
que não seca nem coagula,
que a si mesmo se estimula
e vai, num medido pânico.
Aperfeiçoo a focagem.
Olho imagem por imagem
numa comoção crescente.
Enchem-se-me os olhos de água.
Tanto sonho! Tanta mágoa!
Tanta coisa! Tanta gente!
São automóveis, lambretas,
motos, vespas, bicicletas,
carros, carrinhos, carretas,
e gente, sempre mais gente,
gente, gente, gente, gente,
num tumulto permanente
que não cansa nem descansa,
um rio que no mar se lança
em caudolosa corrente.
Tanto sonho! Tanta esperança!
Tanta mágoa! Tanta gente!
Uma ciece peregrina,
pedúnculo de vorticela,
perpassa sob a janela,
incandesce-me a retina.
Anda como sobre escolhos,
irradiando fragância.
Envolvo-a toda nos olhos;
possuo-a mesmo à distância.
A multidão chama por mim.
Chama e reclama
Que eu nela sou princípio e fim.
Lá vou, lá vou.
Galgo os lanços da escada de roldão
e fluo, coloidalmente disperso,
corpúsculo e onda, sem anverso nem reverso,
fagocitado pela multidão.
(António Gedeão, «Esta é a Cidade», Poesias Completas)
Gedeão compartilha connosco um enérgico cenário urbano. O óculo da janela por onde assistimos à passagem inexorável das multidões e do trânsito é a lente do microscópio. A rua, feita lamela, está fervilhante de uma actividade denunciada pelas frequentes repetições («gente, sempre mais gente, / gente, gente, gente») e o uso de curtas e possantes frases exclamativas («Tanto sonho! Tanta mágoa! / Tanta coisa! Tanta gente!»).
O poeta percebe a metrópole como um tecido vivo, no qual cada cidadão é uma ínfima célula. Uma perspectiva orgânica e organicista do social.
Porém, ao focar a lente e a atenção, o bardo vislumbra um detalhe apelativo: a circe, transmutada em vorticela, protozoário. Faz as vezes da mulher, que se destaca da multitude ou se impõe à natureza: um pouco como o deus verde, no poema de Eugénio de Andrade, ou a Leonor do soneto camoniano. De imediato, o sujeito poético abandona o posto de observação, no microscópio, e não resiste a entrar em cena, ele agora célula também, para ir ao encontro mortal e genesíaco do ser amado.
O uso de tropos importados da ciência pode conduzir-nos ao efeito de estranhamento ele, afinal, uma das pedras de toque da «ars poetica». Afirmava o criador modernista estadunidense Hart Crane que «a poesia é uma arte arquitectural, baseada não na evolução ou na ideia de progresso, mas na articulação da consciência humana contemporânea, sub species aeternitatis, incluindo todos os reajustamentos da ciência». Ou seja, é legítimo o uso de termos técnicos, desde que estes sejam aclimatizados à tessitura temática e funcional do texto.
Outra das características que fazem a imagem de marca da produção poética gediana, muito notada por Jorge de Sena, é a musicalidade. O entrelaçar da literatura na música é uma promiscuidade antiquíssima. Os gregos tinham as odes, ou canções breves. Os goliardos deixaram-nos grqande produção de temas espirituais ou licenciosos. Os trovadores traziam as baladas de amor ou pungentes de sarcasmo nas cordas do citolão, cavaquinho, flautas, tamborins, etc. Já James Joyce, uma figura incontornável da irlandesa de expressão anglo-saxónica, defendia: «ninguém senão o poeta é capaz de absorver em si a vida que o cerca e de a catapultar, renovada, por entre música planetária».
À míngua de violinos a enternecerem e eternizarem o instante eufórico do reencontro entre as células, Rómulo de Carvalho traz-nos a harmonia musical das próprias sílabas e palavras uma característica que a sua imagem de marca. A prová-lo, as diversas canções a que os seus textos deram aso, nas vozes de Manuel Freire e José Niza. Este último afirma:
«Sempre me aconteceu, ao ler poesia, ouvir uma música que não sabia donde vinha. (...) Mesmo que essa música seja só o íntimo silêncio que «ouço», ao ler um poema. Mesmo que, como no «jazz», a poesia dita, recitada, faça apenas nascer o jogo dos contrastes, das acentuações, dos climas, cortina difusa onde as palavras se apoiam e circulam na música. Mas principalmente, quando taco-a-taco, poesia e música se fundem em canção, não se sabendo onde acaba uma e começa a outra. (...) De tudo isso fiz com poetas como Camões, Brecht, Bocage, Almeida Garrett, Manuel Alegre, Rosalía de Castro, Paul Éluard, Aleixo, Lorca, Castelao, Miguel Torga, Jacques Prèvert, Vinicius de Moraes, com outros, em canções, em muitos casos ainda inéditas.Mas foi com António Gedeão (e também com Manuel Alegre) que as coisas foram sempre fáceis. A explicação é simples: é que a sua poesia já contém em si as principais estruturas da construção musical, basta encontrar a chave, o fio condutor, e tudo é quase um automatismo. Um automatismo tão imediato, tão directo, que me aconteceu musicar um poema de António Gedeão durante os poucos minutos da sua leitura».
E, na verdade, um leitor atento, repara também no potencial fónico de «Esta é a Cidade». A escolha de termos com sonoridade apelativa («ziguezaguear»), os jogos de palavras («treme e freme, freme e treme», «sem anverso nem reverso»), e, naturalmente, a própria rima.
Há alguns meses atrás, estive, juntamente com mais oitenta poetas de três dezenas de países, no IIº Internacional de Poetas, promovido pela universidade de Coimbra. Vi, por assim dizer, como paravam as modas em termos de produção literária. Fiquei deliciadamente surpreendido com as tendências da poesia de expressão anglo-saxónica. Com efeito, poetas americanos e canadianos, ingleses e irlandeses apostavam fundamentalmente na sonoridade da poesia. A mensagem era propositadamente relegada para unm plano inferior, em proveito de uma incrível acuidade fónica. Dir-se-ia que as palavras eram vistas quase como símbolos fonéticos e a sua musicalidade explorada de uma forma muito criativa. Desde termos que decompostos formavam outros, ao uso de rima; da cacafonia à aliteração; dissonâncias propositadas e assonâncias; hiatos e contrações, e um sem número de efeitos que nos deixaram, a nós, os lusófonos, boquiabertos. Alguns dos nossos colegas estrangeiros usaram máquinas de ritmo, efeitos de eco, chegando três deles a ler poemas diferentes em simultâneo, mas num compasso idêntico. Conversei longamente com o poeta Al Berto sobre isto. Ele foi perentório: «Tenho dúvidas. Será isto poesia?». Mais tarde, discutindo o caso com o autor canadiano Roy Miki, diante do livro de poemas Random Access File, que me ofertou, aventurei esta hipótese: «Talvez que a poesia europeia não saxónica seja fundamentalmente escrita; enquanto a de expressão inglesa tem por fim ser dita». Miki concordou e propôs: «a literatura brasileira, talvez até pela sua entoação, poderá vir a ser uma ponte entre ambas, combinando a riqueza polissémica com as potencialidades do som».
Curiosamente, e nesse mesmo dia, a Professora Adriane Bebiano propôs-nos a audição de poesia dita pelo autor Tao Lee, em chinês. «Obviamente, não comprendereis a mensagem» adendou. «Mas eu acredito que a poesia é fundamentalmente som». E foi assim que Tao Lee leu e recebeu uma espontânea ovação por um texto incompreensível, mas singularmente melodioso e variado.
Haverá uma telapatia inerente à declamação?
No mês passado, o número 41 da revista AGNI, publicada pela universidade de Boston, Estados Unidos, trouxe uma entrevista que fiz ao escritor e amigo Michael Franco. Em dado momento, indaguei: «É a poesia som?» Respondeu-me: «Não acredito em nenhum poeta que não seja músico».
Há, na literatura, em termos de qualidade reconhecida, dois grupos fundamentais de autores. Primeiramente, aquele que Julius Peterson designou de «grupo directivo» o conjunto de escritores que a comunidade literária assume como sendo fiáveis, canónicos. Por outro lado, e num estrato inferior, emerge o «grupo oprimido» que, ocasionalmente, a história das letras recupera. Se Rómulo de Carvalho passou do desconforto e da iuncipiência do segundo para a galeria exclusiva do primeiro, terá sido por três ordens de motivos: um: a criatividade no uso de termos pertencentes ao vasto campo da tecnologia; dois: a abordagem ideologicamente diferente de uma série de temáticas (vimos como Gedeão se demarcou das vozes dos autores contemporâneos ao desvendar na cidade valores eufóricos); três e por último: a exploração das capacidades sonoras da sua criação.
«Esta é a Cidade», contrariamente a «As Palavras Interditas», não é um poema que salta uma fasquia muito alta. Mas graças ao soberbo uso da vertente sonora, funciona na sua plenitude.
Orfeu toca-nos. E o ícaro Gedeão sai da sua cidade labiríntica, voando ao som das sílabas, sem queda, até à invenção e fantasia do leitor desprevenido.
PERECÍVEL todas (?) as verdades deviam trazer prazo de validade
Com prazo de validade textos diversos com diversos pretextos: apoio ao programa de Filosofia, temas quentes, o que-está-a-dar... Destaques registo (para a História) e comemoração de acontecimentos. Se possível, com perspectivação filosófica. Lexicon vocabulário de Filosofia (ou quase). Muito... aberto: nos temas e no modo de abordagem. Uma espécie de índice do Canto: é também de lá que se pode chegar a (quase) tudo. Arquivo ...de coisas e loisas.
FILOSOFIAS VIRTUAIS os filósofos à conquista do ciberespaço
Ameaças de filósofos textos giros de filósofos... (ainda) jovens Outros cantos onde se fala filosofês Ciberfilosofias recursos filosóficos na net: enciclopédias, revistas, motores de pesquisa...
MULTIMÉDIA ficheiros de som com poesia e música
dez bê música (de Nietzsche, de Mozart, portuguesa, brasileira, da Irlanda, da Polinésia) e poesia
Curso de Primeiros socorros Secretaria de Estado da Segurança Social e Prevenção no Trabalho
Curso de Jovem Empresário Agrícola Ministério da Agricultura
Curso de Aquisição de Competências Sócio Profissionais (PEFDS ) Sendo constituído por duas partes: Uma de Formação teórica com duração de 492horas, estando incluídas 120horas de informática, ministradas pelo Exmº Doutor António Mansilha; e a outra, de Formação Prática com duração de 168horas, correspondendo a um estágio, na entidade Junta de Freguesia S. Eugénia, exercendo as Funções de Toda a Parte Administrativa, Atendimento ao Público, ensaios, debates, levantamentos Sócio Culturais, Patrimoniais, Históricos, Estudos, Planos e Objectivos.
2 de 1 semana cada 1 Seminário de Vila-Real(Padre Feitor Pinto ), incluía temas como: Historial do Cristianismo e das Religiões mais significativas; Cristianismo, outras religiões e liberdade de culto; Igreja e Estado; O cristão e a sociedade contemporânea; Paz, guerra, direitos universais do homem, Objectores de consciência , solidariedade e mecenato; Idealismo e Materialismo; Cristianismo e Marxismo.